Por Silvério Filho
Recebi hoje à tarde, com muita tristeza, a notícia que Elias "Barbeiro", com quem eu "fiz o cabelo" nestes últimos 8 anos, havia falecido num acidente de moto, que ele havia comprado há pouco, com o dinheiro do suor do seu trabalho.
Elias era um típico homem rústico e "bruto" de interior, mas que era uma boa pessoa. Com poucos estudos, sempre demonstrava em nossas conversas que tinha vontade de crescer. Exibia com orgulho no seu salão o certificado do curso técnico que havia feito para cortar cabelo, e sempre comentava sobre as aulas que tinha na EJA, frisando seu esforço e a presença inconveniente de colegas de sala mais novos "que não queriam nada com a vida".
Além de cabeleireiro e barbeiro talentoso, ele levava jeito com eletricidade. Na última vez que eu fui tirar o cabelo, semana passada, comentou mais uma vez do seu desejo de fazer um curso técnico na área, mostrando-me até algumas apostilas que havia conseguido. Disse que tinha dificuldade com a teoria, mas, caso tivesse a oportunidade, iria fazer esforço para "pegar o fio da meada".
Elias sempre gostou de beber com os amigos e de "farrear" segundo suas próprias palavras. Há cerca de 3 anos, porém, ele havia me surpreendido com a súbita conversão ao protestantismo. Das músicas de forró que tocavam no seu salão, restaram apenas as músicas gospel; a Bíblia, com diversas marcações (característica de quem realmente ler tentando entender), estava, agora, sempre na extremidade do banco dos clientes.
Após a conversão, as conversas da hora do corte haviam mudado. Conversávamos a partir sobre os filhos dele (em especial sobre a filha que estava pensando em se casar), sobre os cultos que ele ia nas comunidades rurais, sobre estudos e sobre a felicidade que ele tinha de ter parado de beber. Embora eu fosse católico, sempre o incentivei na caminhada evangélica, por ver o quanto isso o estava fazendo bem.
Para a minha tristeza, Elias acabou se afastando da Igreja Evangélica, depois que passou por alguns problemas pessoais. Sempre que eu ia "tirar o cabelo", perguntava se ele tinha voltado. Ele, por sua vez, sempre dizia que estava se preparando para voltar, sabia que estava errado, mas sempre andava com Deus no coração.
Semana passada, quando fui cortar o cabelo, recebi a notícia de que ele estava frequentando o Terço dos Homens, grupo da Igreja Católica do qual faço parte. Mais uma vez, surpreso, incentivei que persistisse e continuasse participando, comentei que eu também frequentava e que qualquer dia a gente iria se ver por lá. Infelizmente esse momento não chegou.
A ele, homem trabalhador, batalhador, pai e temente a Deus, deixo essa singela lembrança, que, embora feita num momento de tristeza, faço-a na esperança de que Elias terá o descanso da vida eterna.
"Deus que tem poder de dar a vida depois da morte, o descanso do trabalho; não ha outro Deus diante de Vós, nem pode haver outro além de Vós mesmos, Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis cujo Reino não terá fim", Trecho da oração de São Leão XIII.