Publicamos a seguir, na íntegra, o discurso do juiz eleitoral da 8ª Zona (que foi cedido pelo mesmo), Dr. Peterson Fernandes Braga, proferido hoje pela manhã na Secretaria Municipal de nossa cidade, por ocasião da solenidade de diplomação dos eleitos.
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Dr. Peterson |
Exmo. Sr. Dr.
Representante do MP Eleitoral nesta 8ª Zona, em nome de quem saúdo todos os
demais presentes,
Senhores candidatos
eleitos no último pleito,
Meus senhores e minhas
senhoras,
No dia de hoje, com a
diplomação dos candidatos eleitos, se realiza a última fase daquilo que se
convencionou chamar de "Processo Eleitoral", que, nesta 8ª Zona, se
desenvolveu com relativa tranquilidade, demonstrando a natureza pacífica e
ordeira dos eleitores das quatro cidades integrantes.
Todavia, ultrapassadas
todas as fases do processo eleitoral, é hora dos senhores candidatos eleitos,
em especial os que pela primeira vez exercerão mandato eletivo, refletirem
acerca da importância das funções que, a partir do dia 1º de janeiro de 2013,
passarão a exercer.
Nesse processo de
reflexão, não se pode perder de vista que vivemos em uma das regiões mais
carentes do país, castigada, durante grande parte dos anos, pelo flagelo da
seca que, junto consigo, traz outros males igualmente danosos, como a fome, a
mortalidade infantil, o analfabetismo e desemprego. Esse quadro de sofrimento
que marca a realidade nordestina foi descrito, de forma magistral, na obra
"Vidas Secas", Graciliano Ramos, principalmente no trecho em que o
referido autor narra a morte da cadela Baleia, da seguinte e trágica forma: "a
carga alcançou os quartos traseiros e inutilizou uma perna de Baleia. (...) E,
perdendo muito sangue, andou como gente em dois pés, arrastando com dificuldade
a parte posterior do corpo. (...) Uma sede horrível queimava-lhe a garganta.
(...) Uma angústia apertou-lhe o pequeno coração. (...) Baleia queria dormir.
Acordaria feliz, num mundo cheio de preás (...) gordos, enormes."
Infelizmente, será com
essa realidade que os senhores hoje diplomados, no desempenho de seus mandatos,
muitas vezes irão se defrontar, sendo que, ao invés de um animal irracional
como Baleia, terão diante de si seres humanos, pais e mães de família, crianças
carentes, adolescentes em conflito com a lei, enfermos e idosos, com os mais
variados tipos de demandas, muitas delas absolutamente inadiáveis.
Para que tais demandas
sejam atendidas a contento, torna-se necessário que todos os senhores assumam
um compromisso com a ética, iniciando-se pela mudança da visão mesquinha,
egoística e equivocada de que o meu senso de coletividade se limita aos meus
familiares e amigos, passando pelo efetivo respeito aos princípios
constitucionais da Administração Pública, expressos nas noções de legalidade,
impessoalidade, moralidade publicidade e eficiência.
De fato, somente a
mudança dos atuais paradigmas éticos e morais terá o poder de modificar, de uma
vez por todas, o quadro de pobreza e tristeza do semi-árido nordestino, descrito
na obra de Graciliano Ramos. Tão verdadeiro é este raciocínio que Albert
Einstein, certa vez, afirmou que "a sorte da espécie humana depende hoje
mais do que nunca de sua força moral. O caminho a um estado alegre e feliz
passa pela renúncia e pela autolimitação, onde quer que seja".
Por outro lado, não se
tem como implementar a mudança ética tão sonhada sem a necessária opção pelo
pobres e desassistidos, os quais, infelizmente, se amontoam em nossa região.
Nesse particular, o Frei Leonardo Boff, em sua obra "Ethos Mundial: um
consenso mínimo entre os humanos", assinalou que "o princípio
supremo e absoluto da ética reza: liberta o pobre", pois "a
existência jamais é pura existência; é uma co-existência". Por isso,
citando ainda o mesmo autor, é que "o consenso mínimo se densifica no
direito à vida, no respeito inviolável aos inocentes, no tratamento justo
dispensado ao detido e na integridade física e psíquica de cada ser humano. É a
base comum mínima, sem a qual não há convivência possível em nenhuma parte do
planeta".
Enfim, sem a mudança na
postura ética dos ocupantes de cargos eletivos, não será possível minorar as
dificuldades e sofrimentos enfrentados por nosso povo. Aqui, dentro ainda da
ideia de mudança dos paradigmas éticos e morais, que visam realmente atender ao
interesse da coletividade, é importante que os senhores eleitos para as Câmara
Municipais desta Zona Eleitoral tenham, desde já, a concepção de que devem
atuar na nobre missão de fiscalizadores do Poder Executivo, e não, como muitas
vezes se constata, na condição de perseguidores implacáveis dos ocupantes de
cargos majoritários ou de meros chanceladores das ação do Executivo, mesmo que
equivocadas ou contrárias ao interesse público.
Finalizo, deixando para
reflexão dos senhores, o seguinte trecho da "Carta de São Francisco aos
Governantes dos Povos", reescrita por mais de mil franciscanos,
reunidos em Brasília, em meados de outubro de 2008: "ouço, vindo de
todos os lados, dois clamores que sobem até ao céu. Um, é o brado da mãe terra
terrivelmente devastada. E o outro é a queixa lancinante dos milhões e milhões
de nossos irmãos e irmãs, famintos, doentes e excluídos, os seres mais
ameaçados da criação".
Muito Obrigado.